sexta-feira, 15 de junho de 2012

Entrevista com o professor Hildebrando Rodrigues

Entrevista publicada na edição 96 do Jornal ICMCotidi@no.

Por: Davi Marques Pastrelo

O Prof. Dr. Hildebrando Munhoz Rodrigues é docente do ICMC há quase 45 anos, já foi diretor do Instituto e defendeu a primeira dissertação de mestrado da USP. Ele concedeu uma entrevista para o ICMCotidi@no sobre sua atuação como professor:


1) Quais técnicas o senhor usa para incentivar os alunos no aprendizado de matemática? O que você faz para despertar o interesse dos alunos pela matemática? 

Prof. Hildebrando Rodrigues
R: Em primeiro lugar devo enfatizar que utilizo técnicas de ensino bem tradicionais, giz e lousa são meus principais instrumentos de trabalho. Tentarei descrever como atuo em um determinado curso de graduação, eis alguns itens que considero importantes nesse meu trabalho: Estabelecer normas claras de conduta dos alunos durante as aulas, manter um bom relacionamento com a classe e com cada aluno, apresentar aulas bem motivadas por problemas concretos e práticos e, finalmente, promover avaliações frequentes. Neste semestre estou ministrando a disciplina Equações Diferenciais Ordinárias para o curso de Engenharia Aeronáutica. A primeira aula do semestre é iniciada com apresentações, apresento-me, conto um pouco sobre minha formação acadêmica: Licenciatura em Matemática, na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Rio Claro, hoje UNESP; Mestrado, na Escola de Engenharia de São Carlos (USP); Doutorado, no Instituto de Ciências Matemáticas de São Carlos; Pós-Doutorado, na Brown University, Providence, Rhode Island, EUA. Em seguida peço para cada aluno que se apresente falando seu nome e que diga um pouco de sua formação acadêmica e de que cidade é originário. Depois disso, apresento uma folha com o programa da disciplina, fazendo uma breve análise dos itens a serem estudados. Em uma outra folha apresento o calendários de avaliações e as normas de condutas esperadas dos alunos. Cada aula começa quando escrevo na parte esquerda da lousa a data e alguns itens que descrevem o programa resumido da mesma. Em seguida apresento um problema de motivação, de preferência aplicado. Somente então começo a desenvolver a teoria matemática que será utilizada para resolver aquele problema e alguns outros apresentados em seguida. Procuro apresentar a aula de maneira clara, escrevendo devagar na lousa e procurando interagir com a classe, apresentando ou respondendo perguntas sobre o assunto presente. Quando é o caso, conto também um pouco sobre a história dos matemáticos que contribuíram para desenvolver as teorias apresentadas. Costumo também copiar no final do curso um caderno de algum aluno ou aluna que tenha feito boas e completas anotações desde o início. Vários colegas experientes e também iniciantes fazem cópias dos mesmos para utilização quando forem ministrar a mesma disciplina. Procuro descobrir alunos que tiveram bom desempenho acadêmico em disciplinas anteriores e os estimulo a formarem grupos de estudos com outros alunos, marcando reuniões para discussões de problemas.

2) Como o senhor costuma avaliar os alunos?

R: Todo o meu sistema de avaliação é baseado em avaliações frequentes. Normalmente ele consta de cinco pequenas avaliações - provinhas - e três avaliações maiores - provas. As provinhas são mais frequentes e valem 2 pontos cada uma. Elas tem a duração de uma hora e constam de um ou dois problemas semelhantes aos que são discutidos em classe. As provas tem duração de duas horas e constam de problemas fáceis e de problemas mais difíceis. Nelas o aluno também tem que demonstrar algum teorema que foi demonstrado no curso. Este sistema diminui a ansiedade do aluno durante a prova. Entre as provinhas há uma que é substitutiva para outra que o aluno tenha perdido por alguma razão. Também há uma prova substitutiva para as provas com o mesmo objetivo. Como hoje temos listas de presença com fotos dos alunos, durante a realização de cada prova, vou procurando memorizar o nome de cada aluno. Assim, depois de algumas avaliações, já posso conhecer quase todos da classe pelos seus nomes. Este fato facilita muito meu relacionamento com toda a classe. Como em geral as classes são numerosas eu elaboro quatro provas diferentes, mas equivalentes em dificuldades. As folhas de questões são apresentadas em quatro cores diferentes: branco, verde, amarelo e cor-de-rosa. Assim durante a prova cada aluno não terá nenhum vizinho mais próximo com a mesma cor. Isto evita a comunicação dos mesmos durante a prova. Também não são autorizados celulares sobre as carteiras. No início do semestre procuro analisar o histórico escolar de todos os alunos que estão fora do perfil. Com isso posso planejar meu curso de maneira que haja um melhor aproveitamento não só dos bons alunos, mas também daqueles que trazem deficiências de formação anteriores. Como conclusão, devo enfatizar que o índice de aprovações em cada disciplina que ministro é relativamente alto, devido em parte ao meu sistema de avaliações.


3) A que o senhor credita ser um professor admirado e respeitado no Campus da USP de São Carlos?

R: Temos excelentes professores no nosso Instituto. Tivemos uma escola de formação liderada principalmente pelo Prof. Gilberto Loibel, Prof. Nelson Onuchic e Profa. Lourdes de La Rosa Onuchic, que sempre deram muita importância às disciplinas de graduação. Procurei utilizar e aprimorar esses ensinamentos. Em breve devo completar 45 anos de serviço na USP. Isto significa que já dei aulas e contribui na formação de mais de quatro mil alunos. Já estou passando de mais de 50 alunos que oriento nos níveis de iniciação científica, mestrado e doutorado. Já publiquei mais de 40 artigos científicos. Fui chefe do Departamento de Matemática, diretor do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação, ambos durante 4 anos, e coordenador da Pós-Graduação. Assim sendo, grande parte da minha vida foi dedicada ao ensino, à pesquisa e à administração do ICMC na Universidade de São Paulo.
Tiago de Melo, professor Hildebrando e Guilherme Mazanti


4) Como o senhor coordena seu programa de Iniciação Científica? Quais as vantagens de fazer com que alunos de graduação e de pós interajam? 

R: Desde o início das minhas atividades nessa área procurei seguir em parte o sistema do meu ex-orientador Prof. Nelson Onuchic. Procuro sempre trabalhar com grupos de alunos bem selecionados das várias áreas do campus. Praticamente todos tem média de pelo menos oito. Durante os trabalhos mantenho juntos alunos mais adiantados, alguns que já estão na pósgraduação, outros veteranos na iniciação científica e alunos iniciantes. Os seminários são baseados principalmente nos livros Principles of Mathematical Analysis de Walter Rudin e A Short Introduction to Perturbation Theory for Linear Operators de Tosio Kato. Os seminários são apresentados em inglês alternadamente pelos alunos. Há também seminários especiais para resolução de problemas. Muitos dos meus alunos de programas anteriores foram selecionados pela École Polytechnique, em Paris, na França para um programa de duplo diploma. Quando um novo aluno adere ao programa deixo claro que nosso objetivo principal é dar uma formação básica em Matemática profunda. Mas a oportunidade de ir para a França é um subproduto. Como no último ano houve uma grande procura de alunos interessados no programa, tenho agora como colaborador o Prof. Marcio Fuzeto Gameiro que está coordenando um grupo. Já estamos com pelo menos 15 alunos que são distribuídos em três grupos de quatro ou cinco. Atualmente conto com a colaboração de Matheus Cheque Bortolan, que esteve neste programa desde o primeiro ano de graduação, foi meu aluno de mestrado e agora está no programa de doutorado e com Guilherme Afonso Mazanti, que passou pelo meu programa, estudou e ganhou um prêmio na École Polytechnique na França, e agora é meu aluno de doutorado. Estes alunos servem como modelos para os mais novos.


5) Como o senhor se sente pelo fato de sua dissertação de mestrado ter sido a primeira defendida na USP de São Carlos? 

R: Meu mestrado foi orientado pelo Prof. Dr. Nelson Onuchic. Defendi minha dissertação em 1970, nela abordei como tema Invariância para Sistemas não Autônomos de Equações Diferenciais com Retardamento e Aplicações. O fato de ter sido o primeiro título de pós-graduação na nova estrutura estabelecida pela USP depois de 1969 não é tão importante para mim. O mais importante é o fato de ter sido um trabalho de excelente nível em uma área que foi introduzida no Brasil pelo meu orientador Prof. Nelson Onuchic. Os modelos que envolvem Equações com Retardamento tem muita aplicabilidade em diversas áreas, como biologia, física e engenharia.