terça-feira, 3 de setembro de 2013

Qual a probabilidade de um estatístico ficar desempregado?

Se você respondeu que tende a zero, pode ter certeza de que sua percepção estatística está aguçada, mas poucos sabem que os estatísticos recebem a segunda melhor remuneração média do Brasil
Louzada com a ex-aluna do ICMC, Anaísa Comparini, que já
trabalha como analista júnior no Itaú (crédito: Denise Casatti)
Nas empresas, na academia e no governo, eles são disputados. Em todos os setores, o emprego das metodologias estatísticas tem se tornado uma prática comum. Os bancos, as seguradoras, a medicina, a biologia, a indústria de forma geral, o governo não sobrevivem sem um estatístico por perto.
“Hoje, o mercado absorve todos os bons estatísticos. Recebo constantemente pedidos para divulgar vagas de estágio aos alunos”, conta a professora Mariana Cúri, coordenadora do curso noturno de bacharelado em Estatística do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP São Carlos.
“Existe, no Brasil, uma necessidade crescente por estatísticos e nós não damos conta de atender a demanda”, revela o professor do ICMC Francisco Louzada. Ele realizou uma pesquisa, há dois anos, para avaliar a demanda por esses profissionais na área acadêmica e descobriu que, considerando-se todos os alunos que saem do doutorado, não é possível sequer preencher as vagas dos professores aposentados nos cursos de bacharelado em estatística nas universidades federais e estaduais brasileiras. Na visão do professor, essa situação deve ter se mantido desde então.
Atualmente, existem mais de 30 bacharelados em estatística no Brasil. Mas a procura por esse tipo de curso no país ainda é muito baixa, apesar das vagas que sobram no mercado de trabalho e das excelentes perspectivas de carreira e salário.
Uma pesquisa realizada pelo CareerCast.com, site norte-americano especializado em empregos, a estatística está entre as melhores profissões dos Estados Unidos: ficou em 20º lugar em uma lista que avalia um total de 200 carreiras. Divulgado anualmente, o ranking leva em conta demandas físicas, ambiente de trabalho, renda, estresse e perspectivas de contratação.
Outra pesquisa recentemente divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que os estatísticos recebem a segunda melhor remuneração média do Brasil: R$ 5.416,00 por mês. Entre as 48 carreiras de nível superior avaliadas, ela só perde para medicina, que tem um ganho médio mensal de R$ 6.940,00. Considerando-se o ranking geral das melhores carreiras, em que foram analisados aspectos como taxa de ocupação, jornada de trabalho e cobertura previdenciária, a estatística ocupa a sexta posição.
“A carreira é promissora e sempre há chances de crescer. O salário inicial está em torno de uns R$ 3.000,00 a R$ 3.500,00 mais benefícios (vale refeição, vale transporte, seguro saúde), mas isso varia muito de empresa para empresa”, conta a ex-aluna do ICMC Gabriela Passos. Ela faz parte da primeira turma de estatísticos formados pelo Instituto e, antes da cerimônia de colação, que aconteceu no dia 23 de agosto, já estava trabalhando como analista de inteligência júnior no Grupo Abril. “Sou responsável pela análise dos dados na área de marketing direto com o objetivo de propor melhorias nas ações realizadas”, explicou Passos.
Antes de se formar, ela fez estágio na Embrapa, em São Carlos, realizando análise multivariada e análise quantitativa e qualitativa de dados referentes a experimentos relacionados especialmente com ovelhas, bovinos e plantas. “A estatística é muito ampla e você consegue trabalhar com o que sempre quis. Por exemplo, eu trabalho com marketing agora, mas tenho amigos na área de finanças, medicina, produção industrial etc”, revelou a ex-aluna.
O professor Louzada ressalta essa variedade de atuação alcançada pela estatística: “Há sempre oportunidade de se envolver com os problemas de diferentes áreas. Por exemplo, hoje eu trabalho com dados de câncer de mama, de malária, com metodologia inadimplência e fraudes e com sistemas de avaliação. Em todas essas áreas tenho a chance de encontrar uma aplicação adequada da estatística e de desenvolver metodologias específicas que, talvez, possam ser replicadas para outras áreas”.
Ele explica que um estatístico sempre atua nos bastidores, auxiliando outro profissional a desenvolver sua área de atuação. Por isso, Louzada ressalta que os estudantes de estatística precisam ter capacidade de relacionamento interpessoal e de trabalhar multidisciplinarmente, já que sempre irão atuar com pessoas de diferentes campos do conhecimento. Ele também diz que é preciso gostar de matemática e de computação, mas que se o estudante não possuir aptidão nessas áreas, é possível desenvolver as habilidades ao longo do curso.


Capacidade de relacionamento interpessoal é relevante para
o estatístico (crédito: Natalino Marrach)
Desconhecimento afeta demanda
Mas se há tantas vagas e a remuneração é atraente, porque a relação candidato/vaga nos vestibulares é tão baixa nos cursos de bacharelado em estatística? “Essa baixa demanda tem a ver com a falta de informação sobre o curso. Tanto é que, na Associação Brasileira de Estatística, da qual sou presidente, há uma equipe que foi formada especialmente para divulgar a estatística para os alunos do ensino médio”, opina Louzada.
O professor refere-se ao projeto Bussab de Divulgação e Educação Estatística, que tem os seguintes objetivos: aumentar o conhecimento da estatística e a sua inserção dentro da comunidade; aumentar o número de candidatos para cursos de graduação; e reduzir a evasão nos cursos de bacharelado. Um dos materiais já disponibilizados pela equipe do projeto é uma apostila utilizada na oficina Estatística para todos, voltada a professores do ensino médio. No material, consta que “uma das ferramentas mais utilizadas hoje em dia em todas as áreas do conhecimento é a Estatística, que descreve os dados observados e desenvolve metodologia para tomada de decisão em presença de incerteza”.
A apostila explica também que o “verbete Estatística foi introduzido no século XVIII, com origem na palavra latina status (Estado), e serviu inicialmente a objetivos ligados à organização político-social, como o fornecimento de dados ao sistema de poder vigente, provavelmente para cobrança de impostos e registros de nascimento e morte”. Louzada diz que o pensamento estatístico não é exclusivo de quem faz um curso nessa área, mas que os bacharelandos em estatísticas possuem uma percepção diferenciada porque lidam com fenômenos aleatórios a todo momento.
O professor completou: “A estatística é uma ciência que está presente em todas as outras ciências. A maioria dos achados científicos trata de variabilidade e quem lida de forma adequada com a questão da variabilidade são os estatísticos. Nós pensamos no planejamento adequado, na amostragem eficiente, na melhor metodologia a ser aplicada em cada caso específico, e temos condições de decidir isso de uma forma diferenciada das outras ciências”.
O setor financeiro já percebeu o quanto pode ganhar contratando estatísticos. Atualmente, segundo Louzada, essa é a área que mais absorve os formandos. A ex-aluna do ICMC Anaísa Comparini é analista júnior no Itaú. Ela é colega de turma de Gabriela Passos, mas em vez do marketing, escolheu o caminho das finanças. Depois de um estágio de seis meses no Banco, quando trabalhou com estudos descritivos referentes à inadimplência de clientes – especificamente na área de veículos, Comparini foi efetivada e, agora, lida com modelos de indicadores. “Esses indicadores entram no cálculo do capital econômico alocado, que é o valor que o banco guarda para cobrir riscos da carteira”, contou.
Outra ex-aluna do ICMC que foi absorvida pela área financeira é Cecília Sassi, que trabalha, desde abril, com revisão independente no HSBC. “Eu reviso o modelo que outra área do Banco faz, verificando se a técnica usada está correta, se a metodologia é adequada etc.”, explicou. No futuro, ela pretende seguir carreira no banco, mas não descarta atuar em outro campo, como o da bioestatística.

Sassi finaliza, ressaltando um dos diferenciais do curso oferecido pelo ICMC: “muitos professores daqui já atuaram no mercado de trabalho, eles sabem aonde a gente vai aplicar o que estamos estudando. Então, eles não ensinam só o que está no livro, mas passam também as experiências deles para os alunos. Eu acho que isso foi muito importante na minha formação”.

Texto: Denise Casatti - Assessoria de Comunicação ICMC